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CNBB - Análise de Conjuntura em Julho de 2012

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NACIONAL

 

Rio +20/Cúpula dos Povos

A Conferência Rio+20 governamental e a Cúpula dos Povos, originada no seio dos movimentos sociais, marcaram o calendário da discussão ambiental nos últimos meses junto com os debates sobre o Código Florestal. Os dois eventos ocorridos no Rio de Janeiro decorreram 20 anos após a Conferência Rio92. Desde aquela data muitas mudanças aconteceram, principalmente o agravamento da problemática ambiental previsto no passado, corroborado pelos desastres ambientais no Brasil e no mundo. Estes fatos atestaram a necessidade dos Estados discutirem a questão ambiental e se comprometerem em buscar um padrão de “desenvolvimento sustentável”, no jargão dos participantes da Conferencia Rio+20, ou questionar o “modelo de desenvolvimento” tido como padrão, segundo a leitura dos participantes da Cúpula dos Povos. Os países pobres insistiram que, ao discutir a problemática ambiental, se discutisse também o combate à pobreza e às desigualdades entre países.

No entanto a tônica da Rio+20 não fugiu às tensões que vinham permeando os debates em torno do meio ambiente dos últimos anos. Os países ricos não mostraram disposição em ceder em suas posições já firmadas antes do evento. A ausência dos chefes destes países simbolizou tal posicionamento. O documento final, consensuado entre os países participantes, foi construído com dificuldade e, segundo a maioria da opinião pública, ficou aquém do esperado, sem formalizar compromissos concretos das nações, especialmente as desenvolvidas, com políticas públicas que detenham a degradação ambiental. No que se refere  à necessidade de combater a pobreza, também não se efetivaram marcos que pudessem agilizar esta iniciativa.

Aspectos positivos no processo foram: a existência de um documento comum, o papel exercido pelo Brasil, o fato de se ter clareado melhor o conceito de desenvolvimento sustentável, apoiado no desenvolvimento econômico, social e ambiental, a centralidade do ser humano em qualquer discussão sobe o desenvolvimento sustentável, o foco na erradicação da pobreza, a atenção à questão da água potável e dos oceanos. 

A Cúpula dos Povos, iniciativa da sociedade civil, também foi marcada por tensões inerentes a um espaço tão plural. A Cúpula foi palco de reafirmação de demandas internas dos movimentos ali representados. Apesar disso, o esforço de construção coletiva e a opção de demarcar posições políticas na reflexão ambiental superaram essas limitações. 

A participação dos povos indígenas e quilombolas foi destaque na Cúpula dos Povos. O que uniu estes dois grupos foi a defesa de seus territórios, cada vez mais ameaçados pelo avanço do agronegócio e das atividades mineradoras, carros-chefes da economia do atual governo.

As violências na sociedade brasileira

A sociedade brasileira tem um histórico de violência que tem aumentado nos últimos tempos, incluída aí a violência policial, e se explicitado com mais ênfase em alguns setores da vida social. O número de homicídios cresceu de 13.910, em 1980, a uma taxa de 11,7 homicídios a cada cem mil habitantes para cerca de 50.000, em 2010, a uma taxa de 26,2 a cada cem mil habitantes. Isso significa que percentualmente os homicídios mais que dobraram e que, em termos absolutos, quase quadruplicaram.

Fica mais evidente a gravidade da violência no país quando se observa que, nos 12 maiores conflitos armados existentes no mundo em quatro anos, ocorreram 169.574 vítimas fatais diretas e, no total de 62 conflitos, morrem 208.349 pessoas.  No país, no mesmo período houve 192.804 vítimas de homicídio, ou seja, mais que os 12 maiores conflitos armados no mundo e próximo ao total dos 62 conflitos armados no mesmo período.

No caso da juventude, o número de mortes de jovens do sexo masculino é preocupante. Uma leitura com recorte étnico-racial aponta que os jovens negros morrem mais que jovens brancos (cerca de três negros para cada jovem branco), quando vítimas de assassinatos. Os jovens brancos morrem em sua maioria em acidentes de trânsito. No meio escolar, a violência passa pela prática do bullying, diferentes formas de preconceito e também agressões físicas. Acrescente-se o aumento dos casos de violência e assassinatos por questões de orientação sexual.

A violência contra a mulher teve crescimento assustador. Em 1980 ocorreram 1.353 homicídios a uma taxa de 2,3 homicídios para cada cem mil mulheres. Em 2010 ocorreram 4.297 homicídios a uma taxa de 4,4 homicídios para cada cem mil mulheres. A Lei Maria da Penha que funcionou como indutor de redução da violência num primeiro momento após sua entrada em vigor, já não consegue ter esse efeito inibidor da violência. Mais da metade dos homicídios ocorre com arma de fogo.

No quesito trânsito, apesar das campanhas educativas e o rigor da lei, o caos tem aumentado. O trânsito é um grande gerador de violência. O número de vítimas fatais devido a acidentes de trânsito de 1996 a 2010 é de mais de meio milhão, sendo que em 2010 foi algo em torno de 41.000 mortes. As motocicletas transfor¬maram-se no novo vetor do crescimento da mortalidade em vias públicas.

Outra realidade geradora violência diz respeito à drogadição ou à dependência química. O tráfico de drogas movimenta muito dinheiro licitamente e ilicitamente. No caso das drogas ilícitas ou proibidas pela lei, as pessoas que entram neste ramo seguem um código de lei próprio onde a vida humana vale pouco. Dívida oriunda de drogas é paga com a vida. Tal violência também atinge a juventude tanto pela dependência química, como pelo tráfico, pois os jovens traficantes (que têm a vida mais ameaçada) são apenas a ponta de grandes articulações de narcotraficantes.  Normalmente as forças de repressão chegam até estes jovens, mas não conseguem chegar aos “chefes das redes criminosas”.

O espaço de vida familiar, por vezes compreendido como lugar de apoio e cuidado da vida, tem se caracterizado também pelos casos de violência. Neste caso o leque também é amplo. Existem casos de abuso sexual, cárcere privado, agressões físicas e que permeiam famílias de diferentes classes sociais. A ideia do espaço de vida familiar como porto seguro perde a força diante deste quadro, o que também acontece na vida social. Diante de uma situação de contrariedade ou de não atendimento das expectativas da pessoa apela-se para a coerção verbal ou física e não para o diálogo como caminho do entendimento. As diferentes situações de ameaça com as quais se depara podem levar ao uso da ameaça e da coerção como via de conduta social.

Eleições municipais: um olho em 2012 e outro em 2014, em 2018...

Virou lugar comum a assertiva de que a cidadania começa no município. Pois é nele que se percebe mais de perto quando as políticas públicas funcionam e melhoram a qualidade de vida das pessoas. É também nos municípios que se ensaiaram inovadoras práticas de democracia participativa, a exemplo do Orçamento Participativo e dos Planos Diretores Locais. Todavia, as eleições municipais fazem parte de uma agenda maior, por vezes imperceptível para o eleitor, preocupado unicamente com os destinos de sua cidade.

Na ótica dos eleitores, é tempo de renovar ou manter no cargo os prefeitos e vereadores, considerando o que fizeram nos últimos quatro anos, contrastando promessas e realizações. É o momento de debater e escolher os caminhos para uma cidade sustentável e fortalecer o controle e a participação social. Para isso, há mais de quinze mil candidatos e candidatas que disputam as mais de cinco mil prefeituras e cerca de quatrocentos mil candidatos às mais de 80 mil vagas em disputa para vereadores, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Para a elite política, especialmente os grandes operadores do sistema político, as eleições municipais, longe de serem um evento isolado, compreendem-se como parte de um processo mais amplo de disputa de projeto de país, visto serem a base do sistema. Por isso são consideradas decisivas, uma vez que quanto mais prefeitos e vereadores um partido conquista, mais se ampliam as chances de aumentar a representatividade do Congresso Nacional em 2014. Vereadores e prefeitos eleitos são, portanto, apoiadores decisivos no pleito seguinte. 

Ademais, outros ingredientes brotaram no horizonte da elite política. Esta, sensível aos humores das ruas e com rara capacidade de antecipar cenários, já vislumbra uma presidente muito bem avaliada e com excelentes expectativas de poder. As recentes pesquisas de opinião a colocam numa posição mais confortável que seus antecessores. Esta popularidade deve se manter devido às ações cirúrgicas que tem feito no que tange à chamada “faxina ética”, às sensíveis quedas nas taxas de juros e ao recente enquadramento das operadoras de telefonia móvel.

Ao se colocar como porta-voz das expectativas da sociedade, a Presidente Dilma colhe capital político, que funciona como anteparo aos baixos índices do crescimento da economia. A atuação da presidente Dilma sintoniza-se com os sentimentos da maioria da população que se indigna com as taxas abusivas cobradas pelos bancos, com a voracidade por cargos e privilégios pouco republicanos por parte dos agentes políticos, bem como com a baixa qualidade dos serviços de telefonia móvel no país.

Desse modo, aventa-se o seu favoritismo em 2014 e provoca um movimento estratégico por parte do líder das oposições, Senador Aécio Neves, de mirar em 2018. Movimento similar é feito pelo Governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Este opera em duplo movimento: disputar a vice-presidência no campo governista, posição que lhe fortaleceria em 2018; e, antecipar seu projeto presidencial, numa hipótese de fragilidade política da Presidente Dilma, caso as condições econômicas se deteriorem e modifiquem o ambiente político.

Outro fator também pode mudar essa perspectiva. A grande mídia brasileira tem procurado fazer do julgamento do chamado “Mensalão”, a maior epopeia da história da Justiça brasileira, o que pode ter efeitos no resultado das campanhas municipais, como uma “pasteurização” dos partidos políticos no país, fazendo crer aos eleitores que “todos os partidos são iguais”.

Nesse contexto, as eleições municipais alcançam uma dimensão maior do que a imaginada, em que pese que as preocupações dos eleitores sejam eminentemente locais e relativas à administração do município. Em alguns municípios, o que estará em jogo é o realinhamento político com vistas a voos mais altos que apontam para a cadeira presidencial 2018, ou quem sabe, em 2014. Aqui cabe sublinhar os movimentos das forças políticas em Belo Horizonte, São Paulo e Recife.

Em Belo Horizonte, a eleição caminhava com roteiro que conduzia a uma fácil reeleição do atual prefeito, reeditando a coligação que o elegeu em 2008, formada principalmente pelo PSB, PT e PSDB. O imponderável levou a uma eleição que, provavelmente, será das mais disputadas do País.  Ao ganhar contorno de um movimento que transcende a capital mineira, a disputa eleitoral em Belo Horizonte levou ao rompimento da aliança e ao lançamento da candidatura do ex-ministro Patrus Ananias e a disputa tem sido interpretada como o primeiro confronto Dilma e Aécio. Sublinhe-se que o PMDB ao apoiar o PT na capital mineira reforçou, segundo alguns, o vice-presidente na coligação governista.

Em São Paulo, o favoritismo do ex-governador Jose Serra é desafiado pelo estreante em disputas eleitorais, o ex-ministro Fernando Haddad, e o comunicador Gabriel Chalita. A incógnita é a capacidade de o apresentador Celso Russomano se manter com os altos índices de intenção de votos sem estrutura partidária e tempo de TV. Contudo, a questão ainda em aberto é a capacidade de o ex-presidente Lula alavancar seu candidato. Uma derrota em São Paulo pode enfraquecê-lo como estrategista e questionar sua capacidade de transferência de votos.

Em Recife, o governador Eduardo Campos, busca ampliar sua autonomia diante do PT, apostando numa candidatura do PSB, apoiada inclusive com desafetos do petismo pernambucano. A diatribe que culminou com a escolha do senador Humberto Costa o fragiliza momentaneamente, mantendo-o, entretanto, como forte candidato.

O que se observa na configuração das alianças eleitorais é o tom elevado do pragmatismo eleitoral. Fruto do rebaixamento do horizonte programático dos partidos de um lado; de outro, do esgotamento das experiências do exercício do poder que se desenvolveu nos anos 90 do século XX, que a despeito dos limites, alargou os espaços de governança participativa.

 

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